segunda-feira, 7 de maio de 2012

Lua em Flor, de Lurdes Breda

Editora: Edições Vieira da Silva
Ano de Publicação: 2012
Nº de Páginas: 124
O conto O Poema (um dos doze que figuram neste livro) inicia-se assim: «Respirei fundo. Olhei pela enésima vez, a folha de papel à minha frente. O poema permanecia em branco, encarcerado algures dentro de mim ou talvez na tinta da esferográfica.» [continua] 

Uma nova geração de autores de poesia portuguesa parece estar a surgir. No mundo editorial, poucas são as editoras que “abraçam” este género lírico - de se fazer expressar o que há dentro, de quem o sente –, pois dizem que «não vende». Felizmente há editoras que apostam fortemente na temática poética, e é por isso que Lurdes Breda tem já vários livros publicados, sendo este o seu último “rebento”.
A lunação e suas mutações são o pano que adornam o conjunto de poemas e contos deste Lua em Flor. Ora o pano cobre meia-lua, ora descobre-a por completo. É por entre estes interstícios que a autora revela a sua sensível habilidade de criar poesia por entre as palavras e espaços brancos, vazios, onde não há tinta derramada, onde a invisibilidade é, em si, fenómeno de contemplação.
«O silêncio beijava a alvorada, / Lânguida e ensonada, / Quando a lua, / Espreitou do alto, / Aluada e em sobressalto, / Os nossos corpos enlaçados» (…) 
É em deslumbramento que ficamos ao provar frases como estas de tamanha beleza.
«A noite contornava-nos nos olhos do público. Os olhos do público contornavam-nos. Nós contornávamos os olhos do público. Os violinos juntaram-se à harpa. Um tambor rufou baixinho».
Tanto na prosa como na poesia, a autora utiliza uma linguagem similar, carregada de simbolismo lunar e o seu tom é sensual, apetecível de cair em tentação. Os adjectivos de que se serve para transmitir o que vai na sua alma são fortes. Quanto mais intenso é a leitura, maior deixamo-nos levar, tal como o vento – para bem longe.
«O teu rosto, amor, / É canela, açafrão, / Ternura aberta em flor; / Em pétalas de paixão» (…) 
O leitor sente estes cheiros – a especiaria, a flor em festa, a lua em flor e o aroma de luar.
«O teu perfume de luar / Adoça a pele da noite. / Uma gota. Uma estrela. / Por entre seios adormecidos. / Um rasto de luz, / Num corpo de sombra, / Propaga o desejo. / Mulher. Mistério. / (…) Gemido de prazer. / Grito de ave nocturna. / Inebriada a luz suspira. / Crescem rosas nas crateras, / Que o vento desfolha, / Sobre coxas nuas».
A lua é abordada como um elemento metafísico, dual, mudando os sentidos que exalam-se conforme cada fase lunar.
Rui Zink, o prefaciador deste livro refere que «qualquer escritor que se preza sabe que os melhores poemas são sempre feitos sem palavras». Quem ler este livro que fusa palavras, cheiros, sentimentos, sentidos e muito mais, saberá que a leitura será envolvente. Uma nota muito positiva tiro deste belo livro e uma surpresa, o saber que há autoras como Lurdes Breda, que têm o dom de hipnotizar leitores.

[continuação] A chuva continuava a cair. O vento atravessava o jardim em correria, para não se molhar. As gotas de água escorregavam pelo vidro da janela. Algumas detinham-se. Não sei se era eu que as observava ou se eram elas que me observavam a mim. (…) O meu poema em branco, na folha de papel à minha frente, já não era um poema em branco. (…) Apenas não tinha palavras, o meu poema em branco.» O conto O Poema finda assim.

4 comentários:

Miguel Pestana disse...

A sinopse do livro pode ser consultada no endereço seguinte:

http://edicoesvieiradasilva.pt/content/lua-em-flor

Quem tiver um blogue e quiser divulgar o livro, esteja à vontade.

Acho que esta autora merece destaque.

Se divulgares o livro, agradeço que ponhas o link aqui nos comentários deste post.

A Poesia agradece..em silêncio.

Miguel Pestana disse...

. também podem partilhar via Facebook, Twitter,...

Maria Poesia disse...

Lurdes Breda sempre a fazer bons trabalhos. Vou procurar o livro. Gostei da crítica!

Teté disse...

Nunca li nada dela, até porque praticamente não leio poesia. Não é que não goste, mas prefiro um enredo, e como não podemos ler tudo... ;)

Mas adoro contos e escritas poéticas... em prosa! Se o vir por aí, vou dar uma espreitada! :)